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Miguel de Cervantes 1 - O maior expoente da literatura hispânica

  • campusaraujo
  • há 7 dias
  • 14 min de leitura

Miguel de Cervantes Saavedra foi um romancista, poeta e dramaturgo espanhol, considerado o maior expoente da literatura hispânica e um dos maiores autores da literatura universal. Sua obra mais famosa, Dom Quixote de La Mancha (1605), é reconhecida como o primeiro romance moderno ocidental.


Inserido na Idade de Ouro Espanhola (séculos XVI-XVII), Cervantes produziu romances, poemas e peças teatrais, recebendo o título de “príncipe da inteligência” devido à singularidade de seu trabalho. Além de escritor, foi soldado, prisioneiro e cobrador de impostos. Participou das batalhas das potências católicas contra o Império Otomano no século XVI. Poucos documentos sobre seus primeiros anos sobrevivem, deixando importantes lacunas na biografia do autor.


A trama de Dom Quixote 

Dom Quixote é uma das maiores obras da literatura mundial. Combina humor, crítica social e uma reflexão profunda sobre a condição humana. O romance narra as aventuras de Dom Quixote, um fidalgo que, influenciado por livros de cavalaria, decide tornar-se cavaleiro andante para corrigir injustiças. Acompanhado por Sancho Pança, seu fiel escudeiro, Quixote vive episódios cômicos e trágicos, confundindo fantasias com a realidade. A obra aborda temas como idealismo, loucura e desilusão, contrastando os sonhos de Quixote com o pragmatismo de Sancho. Dom Quixote é uma valorização da imaginação humana e da busca por significado na vida.

 A origem e o nascimento de Miguel de Cervantes são temas de investigação e debate, com documentos religiosos e escritos do próprio autor, mas muitas dúvidas sobre sua data, local e contexto familiar. A maioria concorda que nasceu em 29 de setembro de 1547, em Alcalá de Henares, perto de Madrid, e foi batizado em 9 de outubro de 1547 na igreja de Santa Maria la Mayor.


Sua família começa com Juan de Cervantes (1490), avô advogado que administrou propriedades do Duque de Osuna e morreu em Córdoba por volta de 1555. Miguel foi o terceiro dos cinco filhos vivos de Rodrigo de Cervantes e Leonor de Cortinas, que tiveram mais seis filhos: Andrés, Andrea, Luisa, Rodrigo, Magdalena e Juan.


Rodrigo, surdo de nascença, era cirurgião, profissão humilde. Embora haja quem afirme origem aristocrática, a família era de uma linhagem nobre arruinada, segundo o cervantista Ramón León Máinez. As dificuldades financeiras marcaram a vida dos Cervantes, e Rodrigo mudou-se várias vezes, residindo em Valladolid, Madrid e Sevilha. Ele enfrentou acusações por dívidas, que o levaram à prisão, agravando os problemas econômicos familiares.  

Leitor desocupado: sem juramento pode acreditar que eu gostaria que este livro, como filho do entendimento, fosse o mais belo, o mais galante e o mais discreto que se possa imaginar. Mas não fui eu capaz de contrariar a ordem da natureza, que nela cada coisa engendra o seu semelhante. E, assim, o que poderia engendrar o meu engenho estéril e mal cultivado, senão a história de um filho seco, maluco, caprichoso e nunca imaginados de qualquer outro, tal como aquele que foi concebido numa prisão, onde todo o desconforto foi seu assento e onde todo barulho triste ocupa seu lugar?

 

Dom Quixote de La Mancha (Espasa, 2015)

 

A juventude de Cervantes


Miguel de Cervantes foi um leitor ávido desde a infância, possivelmente instruído por um parente, mas sua educação formal é tema de debate. Alguns estudiosos sugerem que ele foi ensinado pelos jesuítas, embora isso não seja consenso. Sua formação ocorreu em sua cidade natal, Alcalá de Henares, e posteriormente em Sevilha, onde estudou gramática e latim com padres jesuítas após a mudança da família em 1563. Lá, entrou em contato com o teatro de Lope de la Rueda, que influenciaria sua obra. Em 1566, a família mudou-se para Madrid.


O mestre Juan López de Hoyos foi importante em sua formação literária, publicando em 1569 uma obra que inclui poemas juvenis de Cervantes, demonstrando seu talento precoce. Cervantes também era fã de teatro, assistindo a várias peças de Lope de la Rueda.


Em 1568, acompanhou Giulio Acquaviva, camareiro e futuro cardeal, em uma missão a Filipe II e, em 1569, mudou-se para Roma para servir como seu camareiro — um episódio pouco documentado, mas crucial. Nesse período, Cervantes viajou pela Itália, visitando cidades como Roma, Palermo e Florença, onde teve contato com a obra de Ludovico Ariosto, especialmente seus poemas de cavalaria, que mais tarde influenciariam Dom Quixote.


Além disso, há um mandado de prisão de 1569 contra um Miguel de Cervantes, acusado de ferir alguém e condenado à revelia, mas sem confirmação de que se trate do autor. A trajetória italiana marcou sua vida e obra, mesclando educação, experiências e influências culturais diversas.


Carreira militar


Se é difícil dizer com precisão quando o autor esteve ao serviço de Acquaviva, não é menos difícil dizer quando o deixou para ingressar no exército regular. Em 1570, ele abandonou o emprego de camareiro e alistou-se como soldado no regimento espanhol de Nápoles, que na época pertencia à coroa espanhola.


Em 1571, Cervantes era soldado raso na companhia comandada pelo Capitão Diego de Urbina que fazia parte do famoso regimento de Miguel de Moncada, e a 16 de Setembro partiu de Messina a bordo do navio Marquesa, que fazia parte da armada liderada por Don Juan da Áustria (c. 1547-1578).


O soldado Miguel de Cervantes

Miguel de Cervantes também foi um soldado de coragem e determinação. Nascido em 1547, em Alcalá de Henares, ele se alistou na Marinha Espanhola em 1570, servindo na Batalha de Lepanto (1571), onde lutou bravamente contra os turcos otomanos. Apesar de adoentado, insistiu em participar da batalha, na qual foi gravemente ferido, perdendo o uso da mão esquerda, o que lhe rendeu o apelido "Manco de Lepanto". Em 1575, foi capturado por piratas argelinos e passou cinco anos como escravo antes de ser resgatado. Suas experiências militares moldaram sua visão de mundo e influenciaram sua obra.

 

Em 1571, Miguel de Cervantes participou da Batalha Naval de Lepanto, na Grécia, organizada pela Santa Liga — formada por Veneza, Espanha, Cavaleiros de Malta e os Estados Pontifícios — para conter a expansão turca no Mediterrâneo. Apesar de estar doente e com febre, Cervantes insistiu em lutar, comandando doze homens em uma galera. Recebeu três ferimentos a bala, dois no peito e outro que mutilou sua mão esquerda, ganhando a alcunha de “maneta de Lepanto”, que carregaria com orgulho.

 

Após a batalha, foi internado em Messina, recebendo uma subvenção de oitenta e dois ducados. Em 1572, transferiu-se para a companhia do capitão Manuel Ponce de León, servindo no regimento de Lope de Figueroa. Participou de combates no Largo de Navarino (1572), na captura de Túnis (1573) e na tentativa fracassada de socorrer Goletta (1574). Passou o restante do serviço militar nas guarnições de Palermo e Nápoles.

 

Em junho de 1575, com a chegada de Don Juan a Nápoles, Cervantes recebeu licença para retornar à Espanha, acompanhada de cartas de recomendação ao rei Filipe II e ao Duque de Sessa, vice-rei da Sicília. Assim, embarcou na galera Sol para pleitear sua promoção e novos cargos em solo espanhol.


Captura, escravidão, resgate e liberdade

 

No dia 26 de setembro de 1575, perto de Les Trois Maries, na costa de Marselha, durante a viagem de regresso à Espanha, a galera Sol em que viajavam Cervantes e o seu irmão Rodrigo, e os seus navios companheiros, “Mendoza” e “Higuera”, foi interceptada por uma flotilha turca, comandada pelo corsário albanês Arnaut Mami, e a sua tripulação levada como prisioneira para Argel. Como Cervantes tinha em seu poder diversas cartas de recomendação de Dom Juan da Áustria, os turcos pensaram que ele era um cidadão ilustre e pediram quinhentas coroas de ouro pela sua libertação.

 

As tentativas de fuga

 

Sem sucesso, Cervantes tentou escapar quatro vezes da prisão em Argel. Sua família libertou o irmão Rodrigo, que tentou resgatá-lo junto a outros cativos, mas o plano fracassou. Em 1576, Cervantes pediu ajuda a Dom Martín de Córdoba, governador de Oram, e tentou fugir com um guia mouro, que os abandonou no caminho, levando-os de volta à prisão.

 

Foi condenado a dois mil açoites, pena que não foi aplicada. Em outra tentativa, levou-o à presença de Hassan Pasha, vice-rei de Argel, que, impressionado, anulou a sentença e o libertou por quinhentas coroas. Cervantes sugeriu ao secretário espanhol, Mateo Vázquez, uma expedição para tomar Argel, mas o projeto não foi aprovado.

 

Participação na Batalha de Lepanto

A Batalha de Lepanto, travada em 7 de outubro de 1571, foi um confronto naval decisivo entre a Santa Liga, liderada por Espanha, Veneza e os Estados Pontifícios, e o Império Otomano. Ocorrida no Golfo de Patras, perto de Lepanto (Grécia), foi a maior batalha de galés da era moderna. Comandada por Dom João da Áustria, a Santa Liga derrotou a frota otomana, enfraquecendo sua supremacia marítima no Mediterrâneo. Lepanto marcou o auge da resistência cristã contra a expansão otomana, simbolizando o poder da coalizão europeia. A vitória teve impacto estratégico e cultural, sendo celebrada como um triunfo da cristandade.

Participação da família na sua libertação


Em março de 1578, o pai de Cervantes apresentou uma petição ao rei destacando seus serviços, e o Duque de Sessa também testemunhou seus méritos como prisioneiro. Na primavera de 1579, sua mãe pediu permissão para enviar mercadorias no valor de dois mil ducados de Valência para Argel e, em julho, entregou aos monges trinitários Juan Gil e Antón de la Bella mais de dois mil ducados para o resgate de Cervantes.

 

No final de 1579, Cervantes conseguiu uma fragata para fugir, mas o plano foi denunciado a Hassan Pasha por Juan Blanco de Paz, monge dominicano que o odiava. Hassan poupou a vida de Cervantes, dizendo que enquanto ele estivesse sob custódia, os cristãos, navios e a cidade estariam seguros.


Pagamento do resgate


Em setembro de 1580, o resgate de Cervantes foi finalmente pago pelo Frei Juan Gil, que arrecadou fundos entre mercadores cristãos. Junto com outros cativos espanhóis, ele retornou à Espanha em outubro daquele ano, embora já estivesse embarcado para Constantinopla quando o dinheiro foi entregue.

 

O processo de resgate foi lento, pois Hassan Pasha recusava aceitar menos de quinhentos ducados de ouro, e o saldo necessário foi obtido com comerciantes cristãos de Argel. Cervantes desembarcou em Dénia em 27 de outubro e seguiu para Madrid em novembro, onde assinou uma declaração notarial em 18 de dezembro.

 

Seu cativeiro durou cinco anos e um mês, tema que inspirou obras como Los baños de Argel e o relato O prisioneiro em Dom Quixote. Essas datas mostram que ele não participou da campanha portuguesa de 1580 sob Alva, mas visitou Portugal após seu retorno e, em 1581, foi enviado em missão a Oram a partir de Thomar. 

O prólogo de Novelas Exemplares (1613) é notável por conter o único autorretrato verbal conhecido do escritor. Nele, Cervantes descreve a si mesmo com humildade e ironia, mencionando sua mão esquerda inutilizada na Batalha de Lepanto, que ele considera uma honra conquistada em serviço à cristandade. Ele também se refere à sua idade avançada, ao cabelo encanecido e à perda de dentes, traçando um retrato vívido e humano de si mesmo. Este prólogo reflete sua autopercepção como um escritor dedicado e sofrido, mas profundamente orgulhoso de seu papel na literatura e na história espanhola.

 Após seu retorno à Espanha, Cervantes esperava ser recompensado com um cargo público por seus méritos militares, mas isso não ocorreu. Em 1581, esteve em Oram em uma missão desconhecida e depois em Lisboa para prestar contas ao governo de Filipe II. No mesmo ano, passou um tempo com a família em Madrid antes de se mudar para Portugal, onde buscou recomeçar a vida e pagar dívidas familiares.

 

Tentou um emprego nas Índias Ocidentais em 1582, sem sucesso. As histórias sobre romances com uma nobre portuguesa e uma filha são invenções. Entre 1582 e 1587, escreveu diversas peças para o teatro, como Los Tratos de Argel, La Numancia e La Batalla Naval, que ele próprio considerava dignas de elogio, mencionando-as na obra Adjunta al Parnaso.


Andaluzia, Sevilha e Valladolid

 

Entre 1582 e 1583, pouco se sabe sobre Cervantes, exceto seu caso amoroso com Ana Villafranca de Rojas, casada, com quem teve uma filha, Isabel de Saavedra. Em 1584, retornou à Espanha, conseguiu um cargo público em Madri e iniciou a escrita de La Galatea, sua primeira obra literária importante, publicada em 1585. Estabeleceu contato com escritores renomados da época, como Luís de Góngora e Lope de Vega, e escreveu peças dramáticas como Los Tratos de Argel e La Numancia.


No mesmo ano, casou-se com Catalina de Salazar y Palacios, mas o casamento foi infeliz. Após dois anos, sem filhos, Cervantes viajou bastante pela Andaluzia, até fixar-se em Sevilha, em 1588, como comissário real de abastecimentos para as frotas rumo às Índias. Seu cargo o envolveu em conflitos, acusações de má gestão e corrupção, das quais foi inocentado. Em 1597, passou um breve período preso após a falência de um banco ligado às cobranças alfandegárias.


Foi nomeado coletor de impostos da Coroa nos reinos de Granada, viajando frequentemente pela Andaluzia e La Mancha. Devido a atrasos na prestação de contas, foi preso três vezes; acredita-se que escreveu a primeira parte de Dom Quixote durante a prisão em Argamasilla del Alba (1601-1603).


A vida familiar de Cervantes foi marcada por perdas: sua mãe faleceu em 1593 e seu irmão Rodrigo morreu em batalha, em 1600. Em 1604, instalou-se em Valladolid com suas irmãs, filha e criada. Quanto à participação em campanhas militares, há dúvidas, pois as alegações sobre seu envolvimento nas expedições dos Açores confundem-se com seu irmão Rodrigo.

 

Linha do tempo de Miguel de Cervantes

1547 - Miguel de Cervantes é batizado em 9 de outubro, em Alcalá de Henares, Espanha (nascimento provável em 29 de setembro).

1569 - exila-se em Roma após possível envolvimento em um duelo. Trabalha como camareiro do cardeal Giulio Acquaviva.

1570 - junta-se à Marinha Espanhola.

1571 - luta na Batalha de Lepanto, onde perde o uso da mão esquerda.

1575 - capturado por piratas argelinos a caminho da Espanha, é feito escravo em Argel.

1580 -  é resgatado após cinco anos de cativeiro.

1584 - casa-se com Catalina de Salazar e publica La Galatea.

1597 - é preso por problemas financeiros em Sevilha.

1605 - publica a primeira parte de Dom Quixote, que alcança grande sucesso.

1613 - lança Novelas Exemplares, coleção de contos morais e divertidos.

1615 - publica a segunda parte de Dom Quixote.

1616 - morre em 22 de abril, em Madrid, um dia antes da morte de William Shakespeare (segundo calendários distintos).

Miguel de Cervantes pode ter retornado à prisão entre 1602 e 1603, embora não haja provas documentais. Há debate sobre onde ele concebeu as ideias para Dom Quixote — se na prisão de Argel ou em Sevilha. Em 1604, mudou-se de Sevilha para Valladolid, vivendo com a esposa, irmãs, sobrinhas e sua filha natural.


A vida doméstica foi difícil: um esfaqueamento na rua em frente à casa, em junho de 1605, levou à prisão absurda de toda a família. Depois, ao acompanhar o tribunal para Madrid, enfrentou problemas financeiros e conflitos familiares. Durante os anos seguintes, a família mudou-se por várias ruas até finalmente se estabelecer na Calle de León.


Publicações de Dom Quixote


Em julho ou agosto de 1604, Miguel de Cervantes vendeu os direitos da primeira parte de Dom Quixote ao editor Francisco de Robles. A publicação ocorreu em janeiro de 1605, com o texto sofrendo muitos erros de edição, atribuídos por muito tempo a Cervantes. A venda dos direitos fez com que ele não obtivesse grandes lucros, dependendo de patrocínios, como os do Conde de Lemos e do arcebispo Dom Bernardo de Sandoval y Rojas, que lhe garantiram alguma estabilidade financeira. Apesar disso, Cervantes buscava uma reputação literária maior, comparável a nomes como Lope de Vega e Luis de Góngora, e entrou em seu período mais produtivo já aos 57 anos.


Em 1609, ingressou na ordem dos Escravos do Santíssimo Sacramento, tornando-se franciscano terciário em 1613. Participava da vida literária em Madrid, frequentando a Academia Selvaje. Por volta de 1614, estava escrevendo a segunda parte de Dom Quixote, mas, em setembro daquele ano, surgiu uma continuação espúria, publicada em Tarragona por Alonso Fernández de Avellaneda, que ofendeu Cervantes. Ele respondeu incorporando críticas ao rival em seu livro.


A segunda parte de Dom Quixote foi publicada em 1615 e rapidamente reeditada em várias cidades europeias. É considerada mais rica e profunda que a primeira. Nos anos finais, Cervantes mencionou outros projetos literários, como Bernardo e Semanas del jardín, que parecem não ter sido concluídos. Seu último romance, Los trabajos de Persiles y Sigismunda, publicado postumamente em 1617, buscou renovar o romance heroico e teve grande sucesso, com várias edições e traduções rápidas para francês e inglês.


Os últimos anos de Cervantes

 

Entre a publicação dos dois volumes de Dom Quixote, Cervantes lançou outras obras importantes, como os Romances Exemplares (1613), Viaje del Parnaso (1614) e Oito comédias e oito novos aperitivos nunca apresentados (1615). Já estabelecido em Madrid, após a transferência da corte real, viveu mudanças familiares significativas: suas irmãs Andrea e Magdalena faleceram em 1609 e 1611, e sua filha Isabel casou-se, ficou viúva e casou-se novamente.


Apesar da circulação ampla de seus trabalhos, Cervantes não conseguiu garantir um lugar na corte, nem acompanhar o Conde de Lemos, vice-rei de Nápoles, o que contribuiu para suas dificuldades financeiras até o fim da vida.


Nos seus últimos anos, ele viveu mais recluso, dedicando-se à oração, à literatura e aproximando-se mais da esposa. Gravemente doente, em 1616 dedicou a seu protetor, o Conde de Lemos, seu último livro, Los trabajos de Persiles y Sigismunda, com versos que expressavam sua proximidade da morte: “Puesto ya el pie en el estribo, / con las ansias de la muerte, / gran señor, esta te escribo”.


Em abril de 1616, Miguel de Cervantes contraiu hidropisia, doença que afetava o ouvido interno, causando vertigem e perda auditiva. Em 18 de abril, recebeu a extrema unção e, no dia seguinte, escreveu a dedicatória de Persiles y Sigismunda ao Conde de Lemos, sua despedida literária e emocional. Faleceu em Madrid, provavelmente em 22 ou 23 de abril de 1616, aos 68 anos, sendo sepultado no convento das religiosas trinitárias da Rua de Cantarranas, embora a posição exata do túmulo permaneça desconhecida.


Não há registro de testamento, e a transferência dos restos em 1633 é considerada infundada. Sem recursos, o funeral foi custeado pela Venerável Ordem Terceira de São Francisco. Sua viúva, Catarina, organizou a publicação póstuma de Persiles, que teve oito edições em dois anos, mas caiu em desuso até o século XVIII.


Romances Exemplares consolidaram sua fama entre os romancistas espanhóis, mas foi Dom Quixote que garantiu a Cervantes um lugar entre os maiores escritores de todos os tempos, sendo uma obra atemporal que continua profundamente admirada.


Legado literário

 

A obra de Cervantes faz parte do legado literário universal e suas obras estão sendo estudadas e republicadas. Depois da Bíblia, Dom Quixote é o livro mais traduzido e editado da história, e tem sido amplamente estudado por intelectuais internacionais, como Vladimir Nabokov (1899-1977), Gyorgy Lukács (1885-1971) ou Jorge Luis Borges (1899-1986).

A dedicatória de Os Trabalhos de Persiles e Sigismunda, escrita por Miguel de Cervantes, é uma despedida tocante, pois foi concluída poucos dias antes de sua morte. Dirigida ao conde de Lemos, mecenas do autor, Cervantes reflete sobre sua iminente partida e expressa gratidão pela proteção recebida. Ele se descreve com humildade, aceitando o fim próximo com serenidade e destacando sua fé cristã. A dedicatória também ressalta a importância da obra, que ele considerava sua criação mais refinada, mesmo superior a Dom Quixote.

Hoje, Miguel de Cervantes é considerado o grande autor da cultura hispânica e o criador do romance moderno e do romance polifônico. O romance polifônico envolve uma multiplicidade de consciências, de personagens que dialogam entre si e com seu autor-criador. Já o romance monológico envolve uma só consciência, a consciência do autor, à qual todas as demais consciências das personagens estão subordinadas.

 

Suas obras, de enorme originalidade, abrangem os gêneros poesia, romance e dramaturgia, e até crítica literária. Em particular, ele cultivou com sucesso o aperitivo, a comédia, o romance pastoral e outros gêneros da época.

 

Seu nome também acompanha o maior prêmio literário da língua espanhola, concedido anualmente pelo Ministério da Cultura e Esportes da Espanha desde 1976. Além disso, existem monumentos em sua homenagem em todo o mundo. É bastante comum que institutos, escolas, teatros, cinemas e outros espaços culturais levem seu nome. O dia da sua morte, 23 de abril, é comemorado como O Dia do Livro em quase todas as nações ocidentais ֎


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